O jornalista Antônio Gois, da Folha, escreveu um valioso depoimento ontem na coluna do ombudsman. O sogro dele morreu no acidente com o avião da Gol, ocorrido na sexta-feira, dia 29. O desastre do vôo 1907 provocou a morte de 154 pessoas.
Vale a pena ler.
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São Paulo, domingo, 08 de outubro de 2006
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depoimento
"Uma lição para jamais esquecer"
O jornalista Antônio Gois, da Folha, viveu nos últimas dias o drama das famílias que perderam parentes ou amigos no desastre do vôo 1907. Entre os 154 passageiros mortos estava o seu sogro, Mauro Romano. Gois experimentou as dificuldades a que as pessoas aflitas são submetidas nessas horas para obter migalhas de informações e o desagradável, e às vezes agressivo, assédio da imprensa que busca informações e histórias.
Seu relato:
"Soube na noite de sexta-feira por minha mulher, a também jornalista Débora Thomé, que meu sogro estava no vôo 1907. Desde então, além da dor da tragédia, passamos a enfrentar o pior cenário possível para quem busca alguma informação: a escassez de notícias oficiais e o excesso de especulações por parte da imprensa e de algumas autoridades.
Essas especulações chegaram ao auge quando, no sábado, algumas emissoras de TV e sites de notícias informaram que haveria sobreviventes. As notícias eram creditadas ao secretário de Saúde do município onde o avião caiu e até a fontes da Infraero. Sabendo que não eram informações oficiais, eu e minha mulher tentávamos explicar ao resto da família que ainda era cedo para comemorar. Infelizmente, estávamos certos.
Desde o início da tragédia, ficou claro para mim também que às vezes nós, jornalistas, temos a mesma sensibilidade dos agentes funerários na hora da morte.
No saguão do aeroporto, enquanto esperava longamente por alguma confirmação por parte da Gol, fiquei separado de meus colegas jornalistas apenas por uma fita. Alguns deles corriam apressadamente em cima dos familiares com câmeras e flashes armados em busca de uma imagem. Outros, ainda que a distância, riam e brincavam entre eles, enquanto esperavam que algum familiar se dispusesse a falar.
Houve também quem, nos dias seguintes, ligasse insistentemente para a casa de minha sogra em busca de entrevistas, mesmo já tendo ouvido que a família não tinha condições de falar naquele momento.
Apesar disso tudo, continuo acreditando que o papel da imprensa nesse momento é importantíssimo. Tanto que muitos familiares procuravam voluntariamente os jornalistas para reclamar da falta de informações. No entanto, pude perceber, na prática, que nem sempre respeitamos alguns limites.
Desse episódio, tirei uma lição que nunca vou esquecer. Buscamos tanto a objetividade jornalística e o distanciamento crítico que, às vezes, acabamos também por perder a sensibilidade e, pior, o respeito ao drama de quem passa por uma tragédia como essa. Sem falar na busca acrítica pela informação exclusiva, que, num momento assim, pode só aumentar a angústia de quem está do outro lado."
Monday, October 09, 2006
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